16 de fevereiro de 1787
Iam enforcar a freira ao meio-dia, por atraso do senhor Bispo.
A praça fervilhava de gente ao pé do rio.
A corrente de ar frio fazia a roupa dos portuenses dançar. Muitos, de lábios gretados, escondiam as mãos nos bolsos, para aguentar a geada. Mas o frio que arrepiava toda a gente não era o suficiente para afastar as pessoas da praça.
A multidão acordou com o relinchar dos cavalos. Com o coche do Bispo ainda coberto pela poeira, destrancaram o portão do convento. O arranhar de metal enviou-lhe uma onda fria pelas costas abaixo. Roía o lábio até fazer sangue. Não conseguia estar quieta – o medo de toda aquela cena inundava-a.
Arrastavam a condenada portão fora. Esteve trancada dez dias. Fedia, e o sol alto encadeava-lhe os olhos. Já não caminhava, por isso ia de joelhos esfolados no chão, arrastada por dois guardas. Ia ser enforcada ainda com as vestes de cristo, e uma barriga enorme.
— Ela não tem culpa! — Maria Isabel implorou atrás da procissão. As mãos dela tremiam, sentia que ia vomitar. Aquele era o seu pior pesadelo.
Mal passaram o muro do convento, a multidão aplaudiu.
Trespassar o muro do convento era estranho. Proibido. Ela caminhava devagar, com medo do que podia acontecer.
— Ela não fez nada. — Maria Isabel disse, de olhos postos na figura do Bispo.
— Se não te calas, vais a seguir. — O Bispo comentou.
Ela não disse mais nada.