À hora das primeiras gotas de sangue, um conto
#7 | Ray Bradbury Challenge
As meninas fizeram um círculo no balneário. Maisie levara para a escola algumas fatias de bolo de chocolate, para partilhar com as melhores amigas no seu aniversário. Cada uma escolheu um pedaço, pintando os seus dedos com migalhas deliciosas.
O toque rude acordou as meninas. Apressaram-se a engolir o resto do bolo, sacudiram as mãos e correram, de fato de treino vestido, para a aula de educação física.
Ao entrar no ginásio, a barriga de Maisie deu a volta, parecia ir explodir mesmo junto à bainha das calças que usava. Tinha sido o bolo? Mas estava bom ontem…
Seria a morte?
Não tinha força para andar. A menina ficou congelada à porta, coagulando a entrada. Foi arrastada para dentro do ginásio quando os adolescentes reprovados, que cursavam a turma do 6.º B de forma desatenta, atiraram o seu corpo de meia leca para dentro.
A barriga tinha pedras, lá colocadas durante a noite por uma fada dos dentes maligna, só podia. Não conseguia justificar aquela dor. Havia duas ou três navalhas no baixo-ventre a penetrar a sua pele esbranquiçada. De mãos na barriga, deu dois passos em frente e sentou-se no chão. O chiar das suas sapatilhas enquanto se sentava acordou o professor, um careca nojento sentado a uns metros dela, um acéfalo preso ao novo iPhone que brilhava na direção da sua cara de estrume. Ele discordava.
— O que se passa? — Sussurrou uma das suas amigas ao seu ouvido, ainda de pé.
— A minha barriga…
— Levantem-se. — Ordenou o professor, levantando-se ele também.
Maisie tentou levantar-se.
O peso do corpo puxou-a para baixo, e ela voltou ao chão, depois de um voo breve. A costura das calças entre as pernas passou de cor-de-rosa bebé a um bordô satânico. Sangrava. Seria aquilo a morte? A mancha crescia e crescia, como se bem irrigada.
A dor física passou ao pânico. Uma onda elétrica correu-lhe o corpo e a pré-adolescente corou de forma incontrolável. Colou as mãos à cara, para afastar a vermelhão, mas nada acontecia.
— Será que a senhorita se importará de se juntar a nós? — Disse o professor, monocórdio.
Que puto de acéfalo careca, um dia ia vingar-se daquele idiota, pensou Maisie.
Ela fechou os olhos com força. A tentar erguer-se, sentia a vulva molhada. Que vergonha. O que ia fazer agora? Uma parte do seu corpo tinha de a trair? Ia encharcar-lhe as calças todas? Queria esconder-se na casa de banho e ligar à mãe e fugir dali.
A mãe já lhe tinha falado do período… mas não sabia que aconteceria já. Tipo agora. Pensava que lhe acontecia aquilo de noite, e que estivesse no conforto da sua casa para tratar daquele assunto. Com conforto e entreajuda.
— Posso ir à casa de banho? — Sussurrou.
— A aula acabou de começar. Estamos à tua espera.
Ela levantou-se. As pernas eram esparguetes sem forma. A cara dela, um pimento que fervia cada vez mais. A turma, em meio círculo, observava-a. Não só a cara apimentada, mas também as calças sangrentas.
Dá um passo à frente, outro passo.
— A princesa vai demorar muito tempo?
— Eu vou à casa de banho.
— Ficas aqui.
— Preciso de ir à casa de banho! — Disse ela com cara de poucos amigos.
— Ficas aqui. — Disse o professor, como se ela estivesse a mentir.
— Estou com o período, e tenho dores de barriga.
— Ainda não tens idade para isso. É uma questão básica de biologia. Mentir não vale a pena.
E a sala riu-se toda.
Maisie, irada, baixou as calças rosa que usava. As cuecas encarnadas estavam tão húmidas que pareciam quase pingar. As calças, também apareciam um pouco molhadas.
A cara dela era de pedra, fixa.
— Ainda não tem idade para entender uma questão básica de biologia? Mentir não vale a pena.
Maisie levantou as calças e saiu da sala. Embora cada passo lhe doesse muito, ela seguia de cabeça erguida. Depois da porta, correu para o balneário com as mãos na barriga. Mal fechou a porta da casa de banho, começou a chorar.