Podias partilhar um pouco sobre a tua jornada como escritora?
Comecei a escrever fanfiction. Sim, eu sei… Acho que muitos escritores começam assim. As fanfictions nunca foram publicadas, mas imprimi-as na escola, O que significa levar um maço de papel para a escola, O QUE significava que as minhas colegas iriam ver o que tinha na mão. Comecei várias amizades assim (vendo esse momento em retrospetiva).
Comecei a escrever ficção original em 2017. Policiais. Eram horríveis.
O meu primeiro Nanowrimo foi em 2018.
Mesmo após escrever um livro inteiro num mês, e de vencer um prémio literário para contos também em 2018, ninguém acreditava em mim como escritora.
Ou melhor, para escolher não acreditar, é preciso de facto querer saber. As minhas amigas, que me viram a escrever fanfiction, e depois contos, e depois livros, acreditavam e acreditam na minha carreira literária, mas mais ninguém. Era estranho quando um adulto arregalava aos olhos ao ouvir-me falar de prémios literários para jovens, porque lá em casa escrever era mal visto.
Mas ainda bem que continuei. De quase oito anos a escrever, orgulho-me do lugar onde cheguei.
E é tudo por fossa culpa. Obrigada.
Como é que escreves mais do que uma hora por dia? Isn’t that hell?
(uma adaptação de uma conversa sobre o nanowrimo)
É o inferno, sim. Mas só durante o mês do Nanowrimo.
Queria traduzir isto em:
“como é a tua prática de escrita?”
Acho que a prática – a rotina diária sem me preocupar com o resultado – o mais importante no mundo da escrita. Tento escrever todos os dias, é raro não escrever nem um email, ou flash fiction, ou editar um pouco do meu livro (que ando a procrastinar neste preciso momento).
MAS por vezes acontece não escrever. Acontece.
Acho importante escrever todos os dias porque, se continuares a escrever, não tens de “começar” a escrever do nada. Os escritores entendem a dificuldade de começar um novo projeto, começar no “capítulo 1”.
Quando começo um novo projeto, parece que não sei escrever. Não sei colocar uma palavra à frente da outra, o que é ridículo. MAS por isso, tento continuar a escrever (até porque há sempre alguma coisa por editar, que posso melhorar, por isso, mesmo que não esteja muito inspirada, então, posso sempre reescrever um parágrafo).
Qual a inspiração por detrás do novo livro?
ha!
Por acaso não sei responder a esta pergunta.
O novo livro é um livro de contos, por isso cada conto tem a sua inspiração.
Durante o meu secundário, para o distrito de Aveiro, uma escola secundária criou um prémio literário sobre a liberdade e o 25 de abril. Tínhamos 4 páginas. Eu decidi escrever sobre a revolução, sobre uma mulher estrangeira, presa política, e os revolucionários a abrirem as portas das prisões.
Esse contou “cravos” ganhou o 3º lugar. A professora de inglês que coordenava as candidaturas da nossa escola (a minha), entrou pela nossa aula de geografia adentro, olhou para mim no fundo da sala e perguntou a que horas era a cerimónia. A professora de geografia parecia confusa. Para clarificar, a professora diz: “sabem o prémio da escola de Aveiro? A Maria ganhou.”
Podemos dizer que as únicas felizes com a notícia eram as professoras. E eu.
Depois desse dia, todos os anos, agora escrevo quase que um “irmão” – outro conto sobre a ditadura portuguesa. “Mafalda” foi o primeiro, em 2020. “As súplicas não são ouvidas, regras da casa.” E “Um ser de segunda” foram o segundo e o terceiro, em 2022.
São todos diferentes, mas os meus favoritos, de longe, e são todos muito ligados à ditadura.
De que irei escrever sobre a ditadura nos 50 anos do 25 de abril? Ainda não sei.
A primeira coisa que me vem à cabeça é um episódio entre o Caetano e o Gonçalo da Câmara Pereira. Ou a verdadeira razão por que Salazar caiu da cadeira. Nunca contei essa história.
Outro conto interessante sobre o tempo da ditadura é sobre a corrida ao aborto – as viagens para o interior, o secretismo, a dor, a culpa. A morte à espreita.
Mas neste momento não estou a trabalhar em nada.
(bem, na verdade, escrevi um conto para o prémio da fnac sobre uma professora universitária enquanto tentava esconder o crime que cometera que se podia enquadrar. Vamos ver se algum dia verá a luz do dia).
Os outros contos também têm uma vertente histórica, mas nada muito pesado.